O que esperar do funcionamento no Parlamento no Brasil


Se o eleitor fosse realmente decidir seu voto para deputado estadual, federal ou senador, ouvindo a mensagem que os candidatos passam sobretudo nos respectivos jingles, a coisa ficaria difícil. E bota dificuldade nisso aí, gente. Ouve-se cada bobagem nas letras feitas sobre hits do momento com o objetivo de enaltecer o candidato que chega até a ser hilário, muito embora deveria ter uma dose generosa de seriedade na coisa.

O sujeito é candidato a uma vaga de parlamentar. São 17 cadeiras em disputa na Câmara dos Deputados, o tamanho da atual bancada goiana no Legislativo brasileiro. E nestas eleições há uma vaga de senador da República em disputa. São 41 vagas de deputado estadual na Assembleia Legislativa de Goiás. Que o eleitor, o homem comum, não saiba lá muito dizer o que faz um parlamentar, deputado ou senador, vá lá. Agora, o camarada que se candidata a um cargo desses precisava mostrar claramente para o eleitorado que sabe onde está querendo, perdão pela expressão algo tosca, passar a “meter o bedelho”, no período de 2015 a 2018 (deputados estadual e federal) e de 2015 a 2022 (senador).

Quem falou quem se o fulano de tal for eleito deputado a minha, a sua, vida vai melhor? Eu é que não continuo aqui batalhando, trabalhando direitinho, cumprindo meu horário, gastando menos do que ganho, cuidando muito bem da minha vida profissional e financeira, além de rezar sempre ao Divino Pai Eterno em busca da graça de ter saúde para mim e meus familiares, para ver o que é que me espera. Ninguém vai trabalhar por mim nem por quem quer que seja. E a vida da gente não vai melhorar ou piorar por consequência da vitória eleitoral deste ou daquele sujeito.

Parlamentar não é assistente social nem gestor de nada não. Ah, sim, seria bom administrar bem os recursos e o dia a dia do seu gabinete. Mas isso são outros quinhentos. O cabra é eleito deputado ou senador não é para conseguir dinheiro público para este ou aquele município. Se o fizer, tanto melhor. Agora, o candidato apresentar propostas de “lutar” por mais escolas, por mais hospitais, por mais moradias, pode até ser interessante, mas o sujeito terá primeiramente que ser parlamentar de verdade. E isso implica em entender o funcionamento do Parlamento, saber debater as questões que para lá são levadas pela sociedade, formar convicção a respeito disso tudo e votar, de preferência, no interesse da população em geral.

E é sempre bom destacar que um deputado federal é apenas um entre 513 outros deputados. Um senador é um dentre 81 demais senadores. Um deputado estadual é só um deputado entre 41 excelências, conforme está constituída a Assembleia Legislativa de Goiás. Ou seja, destacar no meio dessa gente toda aí não é coisa para qualquer cidadão ou cidadã. É preciso, de cara, saber formar uma equipe de assessores competentes, tratar de entender muito bem como é que funciona de verdade o Parlamento e suar a camisa, trabalhar bastante. Botar os neurônios para funcionar 24 horas todo santo dia. Do contrário...

Agora, se a gente presta atenção na propaganda que o candidato está veiculando e pedindo votos, afirmando que vai fazer e acontecer, é muito provável que ele não entendeu o que poderá ter que fazer, se for eleito, ou sabe direitinho a coisa toda mas está “tirando onde de Migué” para cima do distinto público votante. Em qualquer das hipóteses, penso, o eleitor está sendo passado para trás. E isso não é nem um pouco desejável principalmente para o que chamamos de democracia.

Nos últimos tempos o Parlamento, em todos os níveis, vem perdendo importância principalmente no relacionamento com o poder Executivo. Os parlamentares, sob o pretexto de apoiar uma tal de “governabilidade”, abrem mão de debater as propostas oriundas do Executivo e vão aprovando tudo a toque de caixa, dizendo “amém”, e não são raras as decisões de parlamentares abrindo mão até mesmo de discutir com profundidade projetos de leis imprescindíveis para o funcionamento da máquina do Estado. Acho até que isso decorre do fato de que vários concorrentes a uma vaga no Parlamento queriam mesmo era estar numa cadeira do Executivo.

Basta notar a rapidez com o que um parlamentar eleito aceita convite para tornar-se ministro, secretário de Estado ou do Município, mesmo depois de enfrentar uma campanha difícil e cara. A gente assiste a isso sempre no início dos governos. Está duvidando, leitor desconfiado? Então fique de antenas ligadas acompanhando a formação das futuras equipes de governos e depois voltamos a conversar sobre o assunto. Certamente haverá parlamentar tomando posse na respectiva Casa e licenciando-se para assumir um cargo no Executivo.

Ah, sim! O amigo leitor é daqueles que fica satisfeito só se a gente der nomes para exemplificar. Tudo bem. Lembra-se do Henrique Meirelles, candidato a deputado federal, em 2002, que obteve a singela quantia de 183 mil votos, tendo sido o mais votado daquelas eleições? Ele foi convidado pelo então presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para assumir a presidência do Banco Central onde permaneceu até o final do segundo mandato petista. O mandato de deputado federal foi por Meirelles jogado para as cucuias. Em Goiás, nas eleições de 2010, Thiago Peixoto foi eleito deputado federal com 90.719 votos, pelo PMDB. Convidado pelo governador eleito, Marconi Perillo (PSDB), Peixoto não pestanejou, aceitou o convite, aderiu ao líder tucano e sua vida seguiu de vento em popa. Chega de exemplos, né? Há mais um monte disso por aí.

Quer ver outra prática que, penso, enfraquece o Legislativo? O deputado apenas se licencia do mandato para assumir um cargo no poder Executivo. E muitos ficam naquele vai e volta. Sempre que há alguma votação de interesse do parlamentar-secretário, o cara retorna ao Parlamento. Essa farra tinha que acabar. Ou bem o camarada decide ficar no Executivo ou assume de vez seu cargo no Legislativo. Essa possibilidade do sujeito ficar lá e cá, faz pouco caso do eleitorado que elege uma bancada, mas, na prática, os chefes dos respectivos poderes Executivos deturpam a coisa toda.

Penso que os políticos deviam trabalhar para fortalecer mais o poder Legislativo, e isso devia ser uma tarefa assumida pelos candidatos a deputado e senador. Todavia, quando a gente presta atenção na campanha chamada proporcional, há razões de sobra para ficarmos apreensivos em relação ao que podemos esperar de verdade do funcionamento do Parlamento em terras brasileiras.


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