Acabar com o tabu do voto facultativo


Com toda a obrigatoriedade, vemos que se dá tamanha distorção como a deste baixo comparecimento às urnas e semelhante desperdício de votos.




Os números das eleições brasileiras de domingo passado mostram um dado espantoso, que é o da porcentagem da soma de abstenções e votos nulos e em branco, superior a 32%. Isto significa dizer que um terço dos eleitores alistados não votou ou inutilizou o voto. Pode-se dizer que na verdade a população esteve apenas parcialmente representada no democrático processo de escolha de quem vai governar nos próximos quatro anos.

Pior ainda no Rio de Janeiro, onde tal porcentagem foi além de 40% e a soma de abstenções e votos nulos e brancos foi maior do que a votação recebida pelo governador reeleito. Este imenso desinteresse aviltou a escolha que se fez no Rio no domingo passado e constituiu em retrocesso democrático.

Pregar o voto facultativo no Brasil continua sendo, para os políticos tradicionais, como defender um tabu, mas já há grande aceitação entre os eleitores, que percebem que não deveria ser compulsório o que deveria ser livre opção, resultante de um sentimento cívico.

Com toda a obrigatoriedade, vemos que se dá tamanha distorção como a deste baixo comparecimento às urnas e semelhante desperdício de votos.

Comparemos esta situação com o que ocorreu no primeiro turno da última eleição presidencial na França, país de exemplar e consolidada democracia e onde o voto não é obrigatório. O não comparecimento foi de pouco mais de 4%, mesmo índice de votos nulos ou em branco, ou seja, apenas pouco mais de 8% de não aproveitamento.

Também nos Estados Unidos, onde o voto é igualmente facultativo, a eleição presidencial de 2012 teve bom comparecimento de eleitores e número insignificante de votos desperdiçados.

Vale lembrar que as eleições brasileiras ocorreram com tempo bom em quase todo o País. Na França e nos Estados Unidos, eleições são no outono, estação sujeita a chuvas e até nevascas.

Movido por civismo, livre e espontâneo, o voto facultativo é uma manifestação consciente e esclarecida e, portanto, um voto qualificado – e esta é a razão pela qual os políticos cheios de vícios defendem tanto o voto obrigatório, que não será conquistado por méritos.

O sistema eleitoral brasileiro agregou admirável progresso tecnológico, sob tal aspecto se tornou exemplo e modelo, mas ainda estamos muito atrasados na qualificação da escolha dos candidatos. O voto facultativo contribuiria muito para avanços no sentido de melhorar substancialmente o nível dos eleitos.

Se a protelada reforma política ousar romper o tabu e acabar com a obrigatoriedade do voto, criando o sistema de alistamento eleitoral facultativo, o Brasil dará um grande salto na meta do aperfeiçoamento democrático, tendo como resultado maior a elevação do nível dos quadros políticos.

Com uma boa reforma política, os partidos ficariam obrigados a ser mais exigentes e criteriosos na seleção dos nomes que farão parte de suas chapas. Hoje são absolutamente relapsos nesse sentido.

Hélio Rocha é jornalista e escritor e colunista do Popular. Artigo extraído da edição desta sexta-feira (31 de outubro de 2014), página 7, do jornal O Popular <<< http://www.opopular.com.br >>>


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