Decisões políticas comprometem o judiciário
Quando a opinião pública passa a constatar desvios de foco do judiciário fica propensa a desconfiar da sua eficácia e de sua isenção
Luiz Carlos Borges da Silveira discute as decisões judiciais com viés político. |
A
Justiça é corretamente tida como o último recurso do cidadão
individualmente e das instituições em geral. Portanto, é
igualmente correto esperar-se decisões justas baseadas nos
princípios jurídicos, nas provas e no conteúdo dos autos para que
o resultado produzido seja efetivamente o mais isento e imparcial
possível, ou seja, uma decisão justa. Não é aceitável que
sentenças sejam prolatadas sob efeito de ilações e de outros
princípios.
Infelizmente,
ultimamente temos visto nos tribunais superiores desfechos não
condizentes. Mais especificamente, nos processos que envolvem a
política as decisões têm sido notoriamente com viés político, o
que é errado e perigoso. As sentenças devem ser definidas de forma
superior, sem outras preocupações, especialmente quanto a possíveis
efeitos ou desdobramentos que eventualmente possam provocar. Se assim
não for a justiça não será justa, terá desviado seu objetivo.
Exponho
aqui pelo menos três exemplos recentes evidenciando decisões
políticas adotadas em processos de elevada importância no cenário
nacional:
Na
votação do impeachment
de Dilma Rousseff, em sessão do Congresso Nacional presidida pelo
ministro Ricardo Lewandowski, presidente do Supremo Tribunal Federal
(STF), este se valeu de acordo de entendimento para adotar resolução
claramente política ao cassar o mandato e não suspender os direitos
políticos da presidente. Lembremos que no idêntico processo sofrido
por Fernando Collor, mesmo ele havendo renunciado ao mandato a pena
da inelegibilidade foi aplicada.
Posteriormente,
o então presidente do Senado, Renan Calheiros, descumpriu
determinações do STF e não sofreu a mínima admoestação, quando
se sabe que o não acatamento de ordem judicial pode resultar até em
prisão imediata. O judiciário fez vista grossa para não criar
problemas políticos.
E
no julgamento da chapa Dilma-Temer, o TSE protagonizou pelo seu
presidente uma solução essencialmente política. Em seu decisivo
voto o ministro Gilmar Mendes deixou claro que seu posicionamento
baseou-se não no processo em si, mas na preocupação com a situação
do país. Expressamente, o presidente do Tribunal frisou: “Não
se substitui um presidente da República a toda hora”, e mais
adiante disse: “E preferível pagar o preço de um governo ruim e
mal escolhido do que uma instabilidade no sistema”.
É
até compreensível o cuidado com a estabilidade política e
institucional, porém, este não deve ser o escopo central de um
julgamento. Por isso, entende-se que a Justiça não pode e não deve
ser aplicada mediante subterfúgios ou critérios pessoais do
julgador para não estabelecer perigoso precedente capaz de afetar a
credibilidade na elevada missão do judiciário quando da apreciação
de processos das mais distintas naturezas. Pode inferir que os fins
alcançados pelo delito venham eventualmente a justificar os meios,
além de gerar sofismas sobre as próprias decisões.
Quando
a opinião pública passa a constatar desvios de foco do judiciário
fica propensa a desconfiar da sua eficácia e de sua isenção, fato
evidentemente negativo, porque é essencial que se resguarde a
Justiça como elementar garantia ao cidadão e aos preceitos
institucionais. É fundamental que o judiciário tome seus cuidados.
Até porque as decisões das altas cortes produzem acórdãos,
súmulas e jurisprudência seguidos pelas demais instâncias.
Luiz Carlos Borges da Silveira
é empresário,
médico e professor. Foi Ministro da Saúde e Deputado Federal.
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