Há gestores por aí que ainda confundem o patrimônio público com os próprios bens e direitos...
Da
confusão entre o público e o privado decorrem práticas lesivas ao
patrimônio que pertence a todos
Acho
até engraçada a naturalidade dos políticos, falando de um modo
geral, pela forma como se relacionam com o patrimônio público. Os
caras se apropriam das coisas públicas desde o discurso, passando,
não raras vezes, inclusive pelo domínio de fato, tomando posse
mesmo, valendo-se daquilo que pertence a toda coletividade.
Infelizmente, esse tipo de entendimento, de conduta, não diz
respeito apenas a políticos, mas muita gente do povo, digamos assim,
age de modo parecido.
Ilustremos
a conversa. O sujeito se candidata a presidente da República,
governador de Estado ou prefeito, acaba eleito e assim que assume a
respectiva administração desanda a falar que “herdou” dívidas
imensas e problemas difíceis demais de serem administrados. Na
verdade, isso aí já mostra que o camarada no poder enxerga aquilo
ali como sendo a extensão do patrimônio pessoal doravante.
A
contabilidade nos ensina que o patrimônio é formado por bens,
direitos e obrigações. No caso em tela, o sujeito costuma fazer uma
livre adaptação do conceito, porque, emboletado no poder, age como
se o patrimônio fosse composto apenas de bens e direitos, as
obrigações são repassadas a terceiros. Pior ainda, né? Mas
continuemos.
A
propósito, a visão distorcida do patrimônio público, neste caso,
leva as pessoas a desmerecerem o trabalho anteriormente realizado.
Fica assim. O mundo só existe a partir do momento em que a criatura
toma posse. Exemplifico. O Lula no poder cansou os ouvidos alheios
com a expressão “nunca antes neste país”, sempre ao se referir
aos feitos de suas gestões à frente do governo federal.
Hoje
em dia assistimos tanto ao presidente Bolsonaro como aos seus
auxiliares mais próximos e apoiadores em geral, se referindo às
questões sob a responsabilidade do governo federal como algo que, no
mínimo, não funciona. A expressão o Brasil está quebrado é
espécie de mantra para as autoridades do momento. E tome, além
disso, confusão entre o que é o Brasil e o que é o Governo
brasileiro. Alguém duvida que o Brasil é maior do que o Governo?
Andemos.
Parece
que essa forma de confundir uma coisa com a outra justifica o costume
dos políticos brasileiros (lembrando, em tempo, que nem só
políticos brasileiros metem as mãos na bolsa da viúva) se
apropriarem do patrimônio de todos. Trazendo a conversa aqui mais
para perto de nós, quantas vezes já ouvi de pessoas que vencem
eleições municipais dizendo, por exemplo, “a prefeitura é
nossa!” A vitória nas urnas, muitas vezes, é entendida dessa
forma como uma autorização popular para se cuidar do patrimônio
público ao bel-prazer dos vitoriosos da ocasião.
Não
é algo incomum a gente perceber que o principal mandatário e seus
nomeados se destaquem por decisões até exageradamente personalistas
à frente de órgãos públicos deste Brasil de meu Deus. E isso,
posso estar errado, é uma espécie de mãe de muitas espécies de
práticas lesivas aos interesses públicos. Continuemos.
Dia
desses li a notícia de um prefeito de um município do interior de
Goiás que teve o mandato cassado pela respectiva Câmara de
vereadores após denúncia de terem sido utilizadas mão de obra e
máquinas da prefeitura daquela localidade em serviços numa fazenda
do excelentíssimo chefe do Executivo municipal. Fatos semelhantes
podem ser encontrados facilmente pelo Brasil adentro, mas vale notar
que nem sempre acontece a punição, como esta mencionada que deve
provocar batalha jurídica com resultado final a perder de vista
pelos tribunais brasileiros.
Na
“Capital da Fé” não é muito diferente também não. No dia 10
deste mês, o site do Ministério Público do Estado de Goiás
(MPE-GO) publicou matéria informando sobre a decisão liminar do
juiz Eder Jorge, da Comarca de Trindade, em ação civil pública por
improbidade administrativa, movida pelo MPE-GO, contra o secretário
de Infraestrutura, Trânsito e Transporte de Trindade, Edmar Antônio
Alves (“Coquinho”), e o coordenador executivo de Pavimentação
Asfáltica do município, Diogo de Paula Silveira.
Sim,
no caso referido no parágrafo anterior, a decisão é liminar e pode
cair na fase de recursos, bastando que os acusados comprovem que a
denúncia é equivocada, e pronto. Mas o que salta aos olhos da gente
tem a ver com isso de pessoas ao assumirem funções de gestão no
Serviço Público passem a se conduzir como se estivessem cuidando
dos próprios patrimônios.
Para
encerrar esta que era para ser apenas uma notinha e acabou ficando
maior do que o esperado, vale dizer que é chegado o momento de se
trabalhar para que aconteça a mudança de mentalidade e entendimento
das pessoas, de um modo geral, a respeito dos cuidados necessários a
serem observados por aqueles que se propõem a administrar a chamada
coisa pública, que pertence a todos e não apenas a alguns. Por hora
é isso aí.
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