O isolamento social e o nascimento de novos pais
“Podemos
transformar este momento trágico que estamos vivendo numa
oportunidade de aproximação com todos esses filhos esquecidos
dentro de casa”
Advogado Charles Bicca. (Foto: Divulgação) |
As
medidas restritivas de isolamento social estão mudando a vida de
algumas famílias e consequentemente fazendo com que muitos pais
estejam reencontrando seus filhos perdidos dentro das próprias
casas.
Tem
muitos anos que venho estudando essa grave epidemia social que
denominamos “abandono afetivo”, ou seja, filhos abandonados
totalmente por quem mais deveria ter cuidado deles, que em alguns
casos, podem estar inclusive morando com os pais. É comum que pais
cheguem em casa e de longe acenem para os filhos (quando esses não
estão trancados no quarto), liguem a TV, trabalhem no computador,
paguem boletos, jantem sozinhos, acessem todas as redes sociais, e se
tranquem no quarto.
Estamos
criando uma geração de filhos estimulada somente com objetos
materiais, sem quaisquer limites, com pais emocionalmente
indisponíveis e filhos ainda pequenos entregues (sem supervisão) a
um arsenal de armas tecnológicas. As consequências dessa grave
omissão são as piores possíveis e podem variar desde problemas de
saúde, traumas emocionais, inadequação social, depressão e
outros.
E
no meio de tanta tragédia, esperamos que muitos pais possam
aproveitar o longo período da quarentena para interagirem com essas
crianças e adolescentes, e participarem efetivamente de suas vidas.
E assim, será possível que nesse período de isolamento social
aconteça um outro nascimento: o nascimento de novos pais.
Envolvam
seus filhos nas suas vidas e caminhem de mãos dadas com eles. Ter os
pais como exemplo é a regra, e quando esses filhos ainda sentem que
são importantes para os pais a autoestima melhora. De um modo geral,
filhos que possuem boas memórias da infância com seus pais são
mais propensos a lidarem com as tensões do dia a dia na vida adulta.
Os
pais devem ser para os filhos exemplos de caráter e de como andar
com integridade, servindo sempre de referência maior para eles.
Portanto, cuidem dos seus filhos. Aproveitem esse tempo livre dentro
de casa para reavaliarem essa situação e descobrirem uma nova vida
ao lado deles.
Podemos
transformar este momento trágico que estamos vivendo numa
oportunidade de aproximação com todos esses filhos esquecidos
dentro de casa. Em uma conversa de cinco minutos é possível
sabermos um pouco sobre nossos filhos, seus medos, tristezas,
frustrações, desejos e sonhos. Sejam pais todos os dias, brinquem,
abracem, ensinem, conversem e aprendam a dar carinho e afeto para que
não tenham que conviver com o remorso amanhã.
Neste
momento, a desculpa “não tenho tempo” não cola mais.
Estamos com tempo de sobra, e todos podemos fazer essa importante
reaproximação, com conversas, brincadeiras, filmes (não se
esqueçam da pipoca), livros, jogos de tabuleiro, afazeres domésticos
adequados e jantares em família. É óbvio que a imaginação do que
fazer será de cada família, pois o que realmente importa é não
perder esta valiosa oportunidade de convivência.
E
não tenham dúvida alguma de que um dia seus filhos irão lembrar
bem disso tudo, estará gravado em suas memórias, pois essa tragédia
que estamos vivendo está causando forte impacto emocional, ou por
acaso vocês não se recordam aonde estavam no momento em que os
aviões atingiram as torres no atentado de 11 de setembro de 2001?
Assim,
cabe a cada um de nós decidirmos que agora seremos os capitães do
barco das nossas vidas, para que possamos navegar juntos com nossos
filhos, neste tempo de águas turbulentas, rumo a um porto seguro.
Não
adiem mais essa decisão de participar ativamente da vida dos seus
filhos, pois esse será o legado que irão deixar, e não tenham
dúvida de que será dessa forma que as pessoas irão se lembrar de
vocês um dia.
Acordem
pais. O que vocês estão esperando para dar o primeiro passo nessa
direção ainda hoje?
Charles
Bicca é
presidente
da Comissão de Defesa dos Direitos da Criança, Adolescente e
Juventude da OAB/DF. É
autor dos livros “Abandono Afetivo – O dever de
cuidado e a responsabilidade
civil por abandono de filhos” e “Mãe, cadê
meu pai?” e coautor do livro “Pedofilia –
Repressão aos Crimes de violência
sexual contra crianças e adolescentes”.
Comentários
Postar um comentário
Obrigado por comentar... Vamos analisar para publicar nos comentários.