O Eixo: Os navios negreiros do século XXI

Hoje em dia, embora o racismo não seja tão explícito quanto antes, ele ainda se manifesta de maneira sutil nas relações de trabalho, prejudicando principalmente os trabalhadores negros

Jhonatan Camilo, historiador e escritor. (Foto: Divulgação)


ARTIGO | Jhonatan Camilo Xavier é historiador e escritor

A escravização dos africanos no Brasil é um capítulo sombrio da nossa história, marcado por violência, desumanidade e exploração. Infelizmente, mesmo após a abolição da escravidão em 1888, muitas práticas que se assemelham àquelas vividas pelos escravizados ainda persistem na sociedade atual.

Uma das formas mais evidentes de comparação entre o trabalho atual e a escravidão é a condição de precariedade em que muitos trabalhadores se encontram. Assim como os africanos eram submetidos a condições desumanas nos navios negreiros, hoje em dia muitos trabalhadores são obrigados a suportar jornadas exaustivas, salários baixos e falta de direitos trabalhistas.

Os ônibus atuais podem ser vistos como uma metáfora dos navios negreiros, já que ambos são espaços onde pessoas são transportadas de maneira precária e sem dignidade. Nos navios negreiros, os africanos eram amontoados em espaços apertados e insalubres, sujeitos a doenças e maus-tratos. Da mesma forma, nos ônibus lotados das grandes cidades brasileiras, os trabalhadores são obrigados a viajar em condições precárias, muitas vezes em pé e espremidos uns contra os outros. São tratados como simples peças de uma engrenagem produtiva, sem consideração pelos seus direitos básicos.

Além disso, assim como os africanos eram tratados como mercadorias durante o período da escravidão, hoje em dia muitos trabalhadores são vistos apenas como mão de obra barata e descartável. A terceirização e a informalidade do mercado de trabalho contribuem para essa visão utilitarista do trabalhador, que é explorado ao máximo sem qualquer preocupação com seu bem-estar ou sua dignidade.

Outro aspecto importante a ser considerado nessa comparação é o racismo estrutural que permeia tanto a escravidão quanto as relações de trabalho atuais. Os africanos foram trazidos para o Brasil como escravizados justamente por causa da cor de sua pele, sendo considerados inferiores e destinados ao trabalho braçal. Hoje em dia, embora o racismo não seja tão explícito quanto antes, ele ainda se manifesta de maneira sutil nas relações de trabalho, prejudicando principalmente os trabalhadores negros.

Diante dessas reflexões, torna-se evidente que há uma continuidade entre a forma como os africanos foram tratados durante a escravidão e as condições precárias de trabalho enfrentadas por muitos trabalhadores na sociedade atual. É fundamental reconhecer essas conexões históricas para podermos lutar por um mundo mais justo e igualitário, onde todos tenham seus direitos respeitados e sua dignidade preservada.


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